"As pessoas vêem as coisas como elas são e perguntam 'por quê?'. Eu vejo as coisas como elas poderiam ser e pergunto 'por que não?'." (Bernard Shaw)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A questão do tempo nas obras de arte

Uma prévia sobre o tempo na fotografia
A fotografia utilizada como objeto de comunicação e criação artística, teve sua evolução temporal: histórica, social, psicológica e cronológica.
Em seu surgimento, traçou inicialmente seu tempo histórico, que, ainda com a precariedade dos materiais ou essa transição de descobertas, fez surgir algumas obras (fotos), para a satisfação dos difusores da arte e pesquisadores da fotografia.
Com o caminhar do tempo histórico, a fotografia é marcada pelo tempo social na década de 50 onde a burguesia adota a invenção, os estúdio fotográficos se espalham e as fotos são produzidas em menor tempo.
Esse tempo que a fotografia demorava em ser produzida, também evoluiu de acordo com o tempo histórico, perceptivelmente como mostra abaixo:
1949-exposição à luz: 15 minutos
1840- exposição à luz: 13 minutos
1841-exposição à luz: 2 a 3 minutos
1842-exposição à luz: 20 segundos
1851-exposição à luz: 2 segundos
1880-exposição à luz: menos de 1 segundo
O tempo psicológico é notado pela forma de criação do artista que no caso da fotografia, é vista pela sensibilidade seja ao escolher o objeto fotografado, ângulo, iluminação, entre outros. Esse tempo psicológico é resultante da junção do processo de criação, onde envolve o aspecto mental do fotógrafo e a interação com seu período histórico, este serve de referencial para adotar sua linguagem no momento de fotografar.

O tempo nas artes
Para melhor exemplificar as diferenças trazidas pelo tempo dentro das obras de arte, abaixo são citadas algumas delas e as variedades que o tempo pode abranger:

Gustave Le Gray e a captura das ondas:
 Na obra fotográfica de Le Gray, onde o movimento é perceptível pelo momento exato da captura das ondas, a sensibilidade e a instantaneidade são marcas importantes da década de 50 que ajudou a desencadear o cinema. Com a captura de cenas em movimento, oriundas de uma exposição à luz em menor tempo, inferior a 2 segundos, era visível que a partir dali as obras fotográficas haviam evoluído precisamente. A fragmentação de cada movimento das ondas já poderia ser capturada a partir desse advento, e o tempo se tornara um aliado para criar uma sequência lógica, linear ou ainda documental.

Gaetano Pescee e a forma desconstruída:
A série Up de Pescee é atribuída ao tempo material da obra, na qual as poltronas embaladas a vácuo recebiam a forma utilitária depois que estas embalagens fossem abertas. O processo de interação do usuário das poltronas com a própria arte, ajudou na construção do movimento tanto do ato de abrir as embalagens, como do contato das poltronas com o ar. Esse tempo esperado para a pessoa utilizar o invento, é o aqui apostado como o diferencial para essa obra do ano de 1969, e a própria utilização do material (espuma de poliuretano) foi uma inovação para a época.

Robert Smithson e a interação:
Se pensar em uma obra capaz de comprometer a locomoção do expectador, essa obra será o “Píer em espiral” de Smithson. Criada em 1970, essa obra envolve uma participação física do receptor, onde é necessário o tempo de locomoção da pessoa pelo caminho em espiral até o centro deste, para que a obra esteja completa, uma vez que este movimento pertence a ela. O objetivo dessa locomoção é a mudança de visão do expectador ao mundo: nós somos capazes de definir as visões de acordo com nosso movimento.
Esse tempo de ação corporal, permitiu a Smithson interação entre sua obra e o expectador, que, ao mesmo tempo em que aprecia a obra, faz parte dela.


René Clair e a iconoclastia:
http://www.youtube.com/watch?v=g7pBbZy5z_I
O filme “Entr’acte” de René Clair é conhecido pelas suas sequências de cenas sem linearidade ou combinação, onde a estrutura lógica não é cabível ao filme onde predomina a iconoclastia. Clair manifesta em sua obra cinematográfica, o seu tempo psicológico, com características dadaístas, e em seu tempo histórico (ano de 1924), ajudou a somar seus referencias para que a obra se consolidasse.

Mira Schendel e a fragilidade:
Essa obra de Schendel intitulada “Trenzinho” é o melhor exemplo para relacionar tempo/arte. Feita de papel de arroz, ligados por um fio, o trenzinho de Schendel é uma obra com prazo de validade, pois o material frágil permite a observação da arte pelo receptor apenas em alguns instantes em que a obra é exposta.
Um fato curioso para conciliar os materiais pouco duráveis para a composição da arte é o quadro de Mona lisa que foi pintado em madeira e sofre grandes riscos de danificação, ainda que esteja em uma câmara de vidro com ar rarefeito, os cupins são riscos para o quadro. Ainda há o caso dos reparos feitos na obra, na qual modificou/modifica sua estrutura original, haja vista que o quadro possui mais de 500 anos.

Claude Monet e o impressionismo:
"A estação Saint-Lazare” é o nome da obra de Claudio Monet do ano de 1877. O fato mais importante para a questão do tempo nessa obra é o tempo psicológico, uma vez que Monet utilizou em sua obra uma linguagem diferenciada para a época, resultante do impressionismo, logo os referenciais do autor implicaram na construção do quadro. As pinceladas leves que podem ser vistas na fumaça subindo ao céu, também atribuem ao tempo, em que as formas instáveis da luz geram.


Algumas considerações:

O tempo utilizado nas obras preenche a lacuna entre o expectador e o artista através da interação, também traz novos horizontes para a criação das obras com objetos variados, ou ainda pela captação de referências pelos artistas, através do tempo histórico. As perspectivas estendidas pela boa utilização do tempo relacionada a sensibilidade do artista, a visão futura e a combinação com o passado, faz desse sujeito temporal um determinante para as obras de arte.

Di +

  • Livro: "Geração zero zero: fricções em rede"